De um povo heróico, um brado retumbante

Marcus Vinicius de Azevedo Braga
A Lei número 12.031 de 21/09/2009, de autoria do Deputado Lincoln Portela (PR-MG), definiu que nos estabelecimentos públicos e privados de ensino fundamental, é obrigatória a execução do Hino Nacional uma vez por semana. Como a determinação do Rei ao pequeno príncipe para que o Sol nascesse todo dia, na obra magistral de Exupéry, essa determinação legal formalizou o que muitas escolas na prática já faziam, principalmente as particulares, por entendimento e consciência.
O fato é que dado as seqüelas do longo período de regime militar, essas manifestações cívicas ficaram maculadas com o rótulo de práticas militaristas. Os estudos de Moral e Cívica e OSPB, quando migraram para os Parâmetros Curriculares Nacionais , tiveram seus conteúdos enfraquecidos, dentro da metáfora que “jogaram fora a água da bacia junto com a criança”. Nesse ponto, essa Lei é alvissareira. O diploma legal alterado pela Lei desse ano e que trata dessa questão é a Lei n° 5.700 de 1.09.1971, o auge do governo militar, e estabelece minuciosamente as condições de execução do Hino, sacralizando esse símbolo nacional, com já típica burocratização e normatização excessiva do pensamento militar pátrio. Mas, analisando-se a proposição do parlamentar, vemos que o que se pretende é esse resgate do coletivo, o fortalecimento das instituições. Cultivar o coletivo é muito importante em uma geração que vive a sociedade do consumo, onde o individualismo é um valor reforçado por uma sociedade tecnológica. A escola, como formadora de cidadãos, também cabe cultivar esses valores coletivos.
Entretanto, a grande questão é como trabalhar esse Hino. Apenas o lado cerimonioso, sacralizado, não vai atingir o coração e mente dessa criança/jovem. Esse valor cívico deve ser cultivado de forma ativa, de forma reflexiva e relacionada a prática do aluno. Só cantar o Hino por cantar em uma cerimônia é pouco. Esse trabalho deve se relacionar com a sala de aula, com a questão pátria desmistificada. Amor a pátria é amor aos semelhantes, é amor a natureza, é conservar as coisas públicas, respeitar as Leis e participar da vida pública. Viver plenamnte a Democracia! É preciso romper o conceito de que amor a pátria se resume apenas a ficar perfilado cantando uma música segundo certas regras. A música de fato apenas representa esses valores maiores e isso deve estar posto.
Na discussão no diploma legal o parecer favorável do Relator, Deputado Osvaldo Biolchi (PMDB-RS) apresenta que o autor da proposição justifica a mesma pela “carência em que vivemos da noção de patriotismo e civismo, principalmente por parte da juventude” e apresenta a escola como formadora de cidadãos e que isso se dá pelo culto aos símbolos nacionais. Nisso concordamos com o emérito parlamentar, mas não podemos nos esquecer de superar o modelo do regime militar, para que esse culto aos símbolos se dê no plano interior e relacional de cada aluno e não apenas na aparência da cerimônia.
A nova Lei é um avanço, no sentido de fortalecer uma prática cidadã em relação a coletividade, denominada de Pátria. Mas ela precisa ser vivenciada em uma ótica que não seja a da formalidade puramente. O Hino, per si, já tem uma linguagem rebuscada, de difícil compreensão e de frases de ordens invertidas. Para que os alunos não se tornem meros repetidores desse conjunto de estrofes ininteligíveis, a escola tem de aproveitar esse momento e mergulhar na essência dessas questões do plano coletivo, simbolizados no Hino.
Esse resgate da cidadania é fundamental. Assim como é fundamental ver que o país é mais que uma bandeira colorida, uma música. O país é feito de gente, com uma história comum, em uma mesma base territorial, em luta por uma vida melhor. È preciso enxergar para além desses símbolos, para que o nosso brado retumbante represente o canto de um povo. Caso contrário, ficaremos estacionados no velho modelo de aparências exteriores dos militares…
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