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CUT/MG propõe unidade e mobilização contra ação sobre terceirização no STF

  • 09/06/2014


Debate sobre medida que pode prejudicar classe trabalhadora e sociedade é realizado na Assembleia Legislativa

O risco de os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) serem favoráveis à empresa Cenibra, fabricante de celulose de eucalipto em Minas Gerais, motivou audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), realizada na manhã desta quinta-feira (5), no teatro da ALMG. O STF pode considerar legais as terceirizações da mão de obra utilizadas pela Cenibra, decisão que tornaria nula a Súmula 331, que regulamenta a prática e impede que ela se estenda às atividades fim. Desde 2006, uma ação civil pública pedia a contratação dos trabalhadores e instâncias anteriores mandaram a empresa acatar o pedido, mas a Cenibra recorreu ao STF. Oito dos ministros do STF aprovaram que o julgamento do recurso seja feito pelo Supremo.

A presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT/MG), Beatriz da Silva Cerqueira, salientou que não se trata de um problema que diz respeito apenas aos trabalhadores da Cenibra e propôs unidade e mobilização contra a ação da Cenibra no STF. “Os jovens que ingressam hoje no mercado de trabalho, entram pela via da terceirização, com salários e condições de trabalho muito piores”, disse. Ela citou o exemplo da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), que estaria contratando, de forma terceirizada, jovens do interior do Estado, oferecendo apenas 15 dias de treinamento, enquanto os funcionários contratados receberiam cerca de 6 meses de capacitação. Além disso, segundo ela, os salários seriam mais baixos, a alimentação seria oferecida em forma de marmitas que muitas vezes teria comida estragada e o alojamento seria feito em casas precárias sem camas.

“O Estado é que incentiva uma prática como esta. Isto acontece do nosso lado. Da mesma forma como aconteceu no ano passado, contra o projeto de lei 4.330, é necessário uma empreitada das centrais sindicais contra esta ação da Cenibra. A CUT protagonizou a luta contra o PL 4.330 e conseguimos impedir que ele fosse ao plenário do Congresso.  Agora temos uma luta em que o diálogo com a sociedade é fundamental, pois não é uma questão que vai afetar apenas a classe trabalhadora, mas toda a população. Todos têm que entrar neste debate. O Supremo Tribunal Federal pode mudar a vida de 30 milhões de trabalhadores e trabalhadoras, que seriam terceirizados.  A situação é muito séria, pois a terceirização pode triplicar no Brasil. A nossa luta é para que nossa juventude entre no mercado com a proteção mínima. A CUT está à disposição para construirmos novamente a nossa unidade contra mais uma ameaça aos direitos da classe trabalhadora”, acrescentou Beatriz Cerqueira.

Outros convidados salientaram que a terceirização tem significado, não apenas na Cenibra, uma precarização do trabalho e levado a inúmeros acidentes, alguns fatais.  De acordo com coordenadora do Fórum Sindical e Popular de Saúde e Segurança do Trabalhador, Marta de Freitas, cerca de 80% dos acidentes de trabalho no Brasil se dão em casos de terceirização. “Estamos montando um exército de mutilados com milhares trabalhadores ao ano. Em 2013, cerca de 2.700 trabalhadores morreram. A barbárie já está aí”, disse. A preocupação dos convidados é que a decisão leve a uma manutenção e a um aumento da prática da terceirização no país, já que o STF anunciou a repercussão geral da decisão, o que significaria a extensão do entendimento a outros casos.

O auditor fiscal do trabalho da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Minas Gerais, Fernando Cezar, chamou a atenção para outros grupos prejudicados com a terceirização. Ele explicou, por exemplo, que quando uma empresa tem parte dos trabalhadores terceirizados, o número de profissionais utilizados para calcular quantos jovens aprendizes ou quantas pessoas com deficiências precisam ser contratadas é menor do que o número real. Essa fraude também prejudicaria os cálculos dos salários, que, muitas vezes, são feitos de forma escalonada em função do número de pessoas contratadas. “Quando parte dos trabalhadores são terceirizados, perdem todos, até aqueles que são contratados ou nem fazem parte do quadro da empresa”, disse. Ele falou ainda sobre a dificuldade de fiscalização, já que são, no Brasil, 3 mil fiscais, o que representa menos de um por município.

O histórico da decisão foi feito pelo representante do Ministério Público do Trabalho, Helder Santos Amorim. Segundo ele, durante décadas, a terceirização era totalmente proibida, até que,na década de 1990, foi editada pelo STF a súmula 331, que passou a permitir em casos de atividades de apoio. A argumentação era a de que as empresas precisam focar suas energias nas suas atividades principais. “Passamos 21 anos aplicando essa súmula e a nova decisão nos pegou de surpresa ao dizer que as empresas têm direito à livre contratação”, disse. Para Amorim, a discussão contrapõe dois princípios constitucionais, o da livre iniciativa e a do valor social do trabalho. “Temos argumentos de natureza constitucional de sobra para proteger o trabalhador contra a exploração predatória da sua mão de obra, o que não podemos permitir é que haja retrocesso social”, disse.

“Não podemos permitir que decisão que atinge tantos trabalhadores seja tomada entre quatro paredes, sem nenhuma participação social. O julgamento da ação da Cenibra no STF suscita um debate político. Vislumbramos a possibilidade de os princípios da livre iniciativa se sobreporem aos direitos do trabalho. Como disse a Beatriz, a questão deixou de ser de interesse exclusivo e passou a ser de interesse preponderante da sociedade brasileira. É a ameaça de revogação de direitos sociais que foram conquistados em anos e anos de luta dos trabalhadores, que foram consagrados como direitos e garantias fundamentais. A usurpação de direitos institucionais resultará no surgimento de trabalhadores de segunda categoria, com a legitimação de uma realidade que já se instaurou nos setores mais afetados pela terceirização. O julgamento no STF pode ser um retrocesso. O que está em jogo é o modelo de sociedade que nós queremos para nosso país”, disse o advogado da CUT/MG Luciano Ricardo de Magalhães Pereira.

O tema já foi discutido no Congresso Nacional, mas a matéria não foi aprovada e os presentes na reunião demonstraram também receio de que o Projeto de Lei Federal 4330/04 volte à pauta e acabe aprovado sem que as demandas dos trabalhadores sejam atendidas. “Já temos a notícia de que o projeto está prestes a ser votado e, dessa vez, ele iria direto para o Plenário. E é importante saber que o projeto continua virgem, conforme colocado pelo empresariado, sem contemplar nenhum pleito dos trabalhadores”, disse Bruno Reis de Figueiredo, membro da Coordenação Nacional de Direito Sindical do Conselho Federal da OAB.

O deputado Durval Ângelo (PT) lembrou que a questão da Cenibra é antiga e já foi discutida na ALMG há anos. “Naquela reunião, fomos surpreendidos com filmes e fotos do trabalho terceirizado na empresa. Era trabalho análogo à escravidão”, disse. Nesse caso e na atuação contrária ao PL 4330, o parlamentar considera que foram conquistadas vitórias, inclusive com a contratação de parte dos terceirizados da Cenibra depois de decisões judiciais nas primeiras instâncias. Mas, para ele, a recente decisão do STF representa um grande retrocesso.

Durval Ângelo anunciou que as notas taquigráficas da audiência serão encaminhadas aos ministros do Supremo, aos deputados federais, aos senadores e à Procuradoria-Geral da República. Ele disse, também, que vai solicitar uma audiência no STF para debater o assunto do assunto e sugeriu que as centrais, federações e confederações façam o mesmo requerimento. “O mais importante, como muitos propuseram aqui,  é que as centrais, os movimentos sociais e o povo vão para as ruas contra a ação da Cenibra”, afirmou Durval Ângelo.

(Site 05.06.14 – Rogério Hilário, com informações da ALMG)