Movimentos sindical e sociais protestam contra a terceirização na Assembleia Legislativa

Em audiência pública sem inscrições para debate, manifestantes ocupam galeria e convocam para a greve geral

Numa audiência pública em que o protesto dos movimentos sindicais e sociais ficou praticamente restrito à galeria, isolada do Plenarinho III por um vidro blindex, o projeto de lei que torna a terceirização sem limites (PL 4.330, aprovado na Câmara dos Deputados, e PLC 30/15, encaminhado ao Senado) foi discutido na tarde terça-feira (19), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Ao contrário do que acontece nestas ocasiões, não houve inscrições intervenções e, muito menos, debate. Ainda assim, os manifestantes afixaram, no vidro e nas paredes da galeria, cartazes com a convocação para a greve geral no dia 29 de maio, e protestaram quando convidados defendiam a ampliação da terceirização. A reunião foi solicitada pelo presidente da Comissão de Turismo, Indústria, Comércio e Cooperativismo, deputado Antonio Carlos Arantes (PSDB).

Representantes do setor empresarial e empresários eram maioria entre os convidados que falaram na audiência pública, todos favoráveis à regulamentação da terceirização, embora alguns deles não recomendassem a medida para atividades fins. Apenas os deputados do Bloco Minas Melhor; o auditor fiscal do Trabalho Marcelo Gonçalves Campos; o coordenador do Movimento Mundo do Trabalho Contra a Precarização, Pedro Paulo de Abreu Pinheiro; e o subsecretário de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social, Antônio Lambertucci puderam se posicionar contra o PL 4.330 dentro do Plenarinho III.

Pelo texto aprovado na Câmara dos Deputados, as empresas podem contratar trabalhadores terceirizados em qualquer ramo de atividade para execução de qualquer tarefa, seja em atividade-fim ou meio. Atualmente a terceirização é permitida somente em atividades de suporte, como limpeza, segurança e conservação, nos termos da Súmula 331, do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

De acordo com o subsecretário de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social, Antônio Lambertucci, a questão é extremamente polêmica. “Temos um processo histórico que culminou em avanços para a classe trabalhadora, como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A grande preocupação com a terceirização é que ela se generalize, gerando um risco de diminuir as oportunidades de negociação da classe trabalhista”, afirmou. Ele enfatizou que é necessário um estudo mais detalhado para que se avaliem as consequências da proposta. “Muitas vezes, tratar da normativa do trabalho em momentos de crise significa tirar direitos dos trabalhadores”, refletiu.

Coordenador do Movimento Mundo do Trabalho Contra a Precarização, Pedro Paulo de Abreu Pinheiro repudiou a postura do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, em sua opinião, não ouviu representantes sindicais. Ele afirmou que a terceirização é excludente e representa um retorno à escravidão. “Nos Correios, os trabalhadores terceirizados recebem menos, trabalham mais e não têm assistência médica. Muitos nem sabem qual é a empresa terceirizada contratante. No México, os trabalhadores são, sobretudo, terceirizados. Recebem pouco e a pressão patronal é enorme”, relatou. Para ele, a terceirização enriquece apenas os patrões.

O auditor fiscal do Trabalho, Marcelo Gonçalves Campos, disse que a terceirização representa a supressão de direitos trabalhistas conquistados. “A questão já é regulamentada, apesar de alguns falarem que não. A terceirização hoje é tratada como exceção, e não regra”, comentou. Ele relatou que, em fiscalizações, foi verificada a precarização do trabalho nos casos de terceirização. O auditor falou que o projeto representa a revogação da Lei Áurea, que aboliu a escravidão no País. “O projeto legaliza a fraude que hoje encontramos no Brasil. E vai amarrar as mãos dos órgãos fiscalizadores”, acrescentou.

O consultor do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas do Estado de Minas Gerais (Setcemg), Luciano Medrado, disse que houve pouco debate em relação ao tema e o que houve foi feito de modo radical. Segundo ele, a terceirização, se for utilizada somente para locação de mão de obra, pode significar precarização das condições de trabalho, mas, por outro lado, pode contribuir para melhorar a produtividade das empresas. Para ele, não faz sentido contratar pessoal terceirizado para a atividade fim. Já para a atividade meio, ele considera a terceirização recomendável, pois trará mais competitividade.

Já o deputado Geraldo Pimenta (PCdoB) ressaltou que a maior parte dos acidentes de trabalho ocorre com pessoal terceirizado. “A proposta da terceirização vai desorganizar o mundo do trabalho. O trabalhador vai ter que trabalhar mais, vai adoecer e morrer mais”, afirmou. O deputado Professor Neivaldo (PT) se manifestou contra o projeto. “A terceirização diminui o salário do trabalhador. A empresa que terceiriza não vai ganhar nada?”, questionou. Ele disse que é preciso regulamentar a situação de quem já é terceirizado, e não ampliar ainda mais a terceirização.

Segundo o deputado Rogério Correia (PT), o debate não está radicalizado por si só. “O projeto vai promover a perda dos direitos trabalhistas. Isso não é nada moderno. Volta à época antes do ex-presidente Getúlio Vargas. O empresariado brasileiro deveria ter vergonha disso ”, afirmou. Para o deputado Celinho do Sinttrocel (PCdoB), o projeto trará grandes retrocessos. “Em várias leituras que fizemos, percebemos que a proposta não tem o objetivo de defender os trabalhadores”, concluiu.

Repercussão
A presidenta da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais, Beatriz Cerqueira; o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios (Sintect-MG), Robson Silva; e o diretor do Sindimetro-MG, Sérgio Leôncio, protestaram contra a falta do debate, que impediu que os representantes da classe trabalhadora, à exceção de Pedro Paulo de Abreu Pinheiro, pudessem participar da audiência pública. Eles estiveram na Assembleia Legislativa durante a sessão no Plenarinho III.

“O presidente da Comissão não abriu para o debate, numa tentativa de impor uma versão positiva do PL 4.330. Acho que a população já entendeu muito bem que isso aí é vender uma ilusão. Se o empresariado está tão a favor quer dizer que nós estamos com um problema, querem tirar nas nossas costas o seu lucro. Foi uma tentativa de disputar a opinião sobre isso, porque nós tempos dialogado muito com a população e demonstramos os males da terceirização. Acho que os objetivos deles não foram alcançados. Da forma como se faz, a ausência dos problemas que não puderam ser ditos pelos trabalhadores que vieram já evidenciou a forma errada de dirigir os trabalhos”, disse Beatriz Cerqueira.

“A realidade é que este debate foi totalmente antidemocrático. Os dois primeiros que aconteceram aqui, nesta Casa, sobre o PL 4.330 o plenário pôde se inscrever para falar. Hoje não foi aberto para que pudéssemos fazer nossa exposição. Claro que tentaram convocar um debate para dar uma festa para os empresários em geral. A população veio, participou e mostrou que é totalmente contra este projeto de lei, que é o processo em que se pode terceirizar qualquer trabalhador que é parte da cadeia produtiva. Então estamos aqui justamente para fazer este debate, meio que, enviesado, porque não tivemos a oportunidade de falar lá dentro. Mas ficamos aqui fora para mostrar que este debate está nas ruas. A população viu que vai ser aprovada uma lei que vai acabar com todos os direitos trabalhistas já conquistados. É um negócio que a gente não pode admitir de jeito nenhum e é por isso que nós estamos firmes, com os outros sindicatos, com a CUT, chamando a greve geral para o dia 29, para fazer este debate com toda a população”, observou Robson Silva.

Para o presidente do Sintect-MG, ficou evidente na audiência pública que os representantes do empresariado estão muito mal informados. “Eles não conhecem nada do PL 4.330. Você tem ali a Federação das Indústrias, donos de empresas poderosíssimas em Minas Gerais sequer viram o trabalhador de base dele. Então, eles não querem saber de debater como se pode melhorar as condições do trabalhador, só se preocupam em economizar mais. Como não pagar o plano de saúde, não pagar as férias, não contribuir com o FGTS total. Ou seja, aqui o debate mostrou que o projeto é totalmente desconhecido. Isso mostra que o projeto é uma organização de má-fé para acabar com os direitos da classe trabalhadora.”

“É um absurdo. Eu acho que a nossa posição foi muito importante, porque este projeto não foi discutido e esse Congresso é conservador, é contra os trabalhadores. Nós temos que brigar sim, vamos construir a greve geral e nós metroviários estamos juntos para no dia 29 pararmos Minas Gerais. As pessoas que vieram discutir aqui querem que volte a escravidão. Eles não tiveram embasamento para mostrar a sociedade o que querem. Querem voltar com a escravidão. Tentam mostrar que a terceirização já existe e é vantajoso. Não sei para quem. Dizem que precisam disso. Precisam pra quê?”, definiu Sérgio Leôncio.

(Site CUT/MG – Rogério Hilário, com informações da ALMG – 20/05/15)

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