Municipalização de escolas em Mateus Leme é assunto de debate na ALMG e Sind-UTE/MG denuncia prejuízos para educadores/as e a comunidade escolar

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A municipalização de escolas estaduais de Mateus Leme, por meio do Projeto Mãos Dadas do governo do Estado, foi alvo de debates e muitas críticas, na última quarta-feira (4/4/22), durante audiência pública da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Realizada a requerimento da deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT/MG), a audiência pública contou com a participação de representantes do Sind-UTE/MG, Dieese, vereadores, professores/as e estudantes de Mateus Leme.

Além da falta de diálogo e de transparência no processo de municipalização, a comunidade escolar e o Sind-UTE/MG mostraram grande preocupação com a queda na qualidade do ensino que essa iniciativa poderá trazer.

Nesta sexta-feira, (6/5/22), a Câmara Municipal apreciará o pedido do prefeito Renilto Ribeiro Coelho de adesão ao Projeto Mãos Dadas, do governo do Estado. Se for aprovada a adesão, há uma promessa de destinação de R$ 85 milhões para a prefeitura, que assumirá a responsabilidade pelos últimos anos do ensino fundamental.

Mas, os participantes da audiência rechaçam essa possibilidade e disseram que não estão à venda. “O que está por trás dessa falta de transparência. Por que R$ 85 milhões? Esse dinheiro não deveria ser usado para pagar os profissionais da educação? Dinheiro público tem que ter critérios de utilização e não é o que acontece com o projeto Mãos Dadas”, questionou a deputada estadual Beatriz Cerqueira.

Ela também levantou indagações sobre a existência de um projeto de lei sem impacto e sem estudo. “Não sabemos o que foi pactuado. Como vai ficar a educação infantil? O projeto não tem data. Não temos a informação da absorção do custeio.”

Prefeitura pagará um preço alto com a municipalização

O coordenador da Subseção do Dieese no Sind-UTE/MG, Diego Rossi apresentou um levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos e disse que o Mãos Dadas, pelos números apurados, não terá condições de arcar com os desafios da educação infantil em Mateus Lemes.

A rede municipal de ensino, atualmente, conta com 2.546 matrículas nos anos iniciais do ensino fundamental. Se o município aderir ao projeto Mãos Dadas terá um acréscimo de outras 2.026 matrículas dos anos finais do ensino fundamental. Isso vai significar um aumento de 79,6%. “Com isso, seriam necessários R$ 15,7 milhões por ano. Mas, o incremento de arrecadação do município com transferências de fundos estaduais e federais será de R$ 13,8 milhões anuais.”

De acordo com o levantamento do Dieese, existem 1.023 crianças matriculadas em creches e pré-escolas no município. Para atender à meta estipulada no Plano Nacional de Educação, seria preciso abrir 534 vagas em creches. “Mas, a prefeitura não está nem aí para a educação infantil”, lamentou Diego, que também destacou: “o projeto Mãos Dadas tem sido feito por meio de recursos do Fundeb. No caso da pré-escola, a prefeitura depende muito dos recursos e ela está assumindo uma modalidade de ensino que não é do município.”

Outro alerta aponta para a necessidade da prefeitura ter projeto pedagógico para os anos finais do projeto Mãos Dadas, o que não é uma realidade. Segundo Diego, a prefeitura quer aumentar em quase 80% os alunos do período fundamental, mas, não está preparada para isso. Vale lembrar ainda que o recurso estadual do transporte escolar vai reduzir. Mas, se o aluno deixou de ser estadual e virou municipal, ele não estará mais enquadrado na lei do transporte”.

Outras questões preocupantes

A jornada de trabalho na prefeitura de Mateus Lemes é de 25h semanais e a do Estado de 16h. O/a servidor/a estadual que for cedido em face da municipalização terá que jornada? “Se houver aumento de jornada haverá também o aumento salarial? Como vamos lidar com essa situação?”, indagou Diego Rossi.

A deputada Beatriz Cerqueira afirmou que eles vão criando regras para diminuir direitos e não fazem o debate necessário para ser aprovado rápido. “Como vão coexistir duas carreiras distintas (município e estado)? Qualquer reforma/construção não será feita rapidamente. Tem redução de salário, professoras da estado, desemprego, a prefeitura não poderá fazer contratação fechada, pois, isso é ilegal. Terá que abrir processo seletivo.”

Indignação

Izabela de Souza Floriano tem 17 anos e estuda na E. E. Elias Salomão e em seu relato na audiência pública disse: “Fomos surpreendidos pelo Projeto Mãos Dadas. Se não fosse o vereador Aldair para nos informar sobre tal projeto, o legislativo municipal votaria às escondidas na sexta-feira (29/4). Nós, alunos, pais e funcionários somos contra o projeto, pois, sua adesão causará desemprego e redução de salário para os profissionais da educação. Como irão dar conta dos 6º, 7º, 8º e 9º anos? Não dialogaram com as pessoas que serão impactadas. Peço ao legislativo que nos respeitem, afinal, nossa escola, nossa escolha”.

Nikolle Silva Carvalho da Cruz, 16 anos, também estuda na E. E. Elias Salomão e disse o seguinte: “Quando recebemos a notícia foi um choque para escola toda, tudo parou. Não estamos dispostos a correr riscos. Porque querem fazer tudo isso por debaixo dos panos, sem o consentimento e aprovação do povo. Isso é grave! Tem escolas que foram municipalizadas e estão lotadas.”

A professora Renata Antônia Celestino Puzak lembrou a importância da luta e lamentou o fato do governo do Estado oferecer milhões para jogar sua responsabilidade para o município. “No futuro, quais serão as consequências, os impactos disso tudo? Tenho colegas que foram para escolas municipalizadas e tiveram salários reduzidos. Nós amamos a educação e precisamos ser respeitadas.”

Sirlania Aparecida da Silva, também professora em Mateus Leme, agradeceu à deputada estadual Beatriz Cerqueira pelo apoio e denunciou a falta de transparência. “Não fomos informados deste projeto, que chegou para ser votado na Câmara do dia para a noite. Quando analisamos o projeto não tempos dúvida: a longo prazo ele é um desastre para a cidade.”

Ao longo da audiência, vários manifestantes falaram da indignação ao saber que a Secretária de Educação de Mateus Leme aliou-se ao prefeito sabendo a situação do Estado. São cerca de 3 mil alunos a serem impactados.

“Estamos falando de um projeto de vidas e não de mercadorias. Deveriam estar todos aqui, prefeito, secretária para dar garantias de que irão chegar R$ 85 milhões para construção de creches e escolas. Temos uma em construção há 1 ano e meio. Em 10 anos, teríamos esses recursos investidos?, questionou o professor Alexandre Fonseca Santos.

Indagaram ainda sobre como será feita a compatibilidade de horário, a questão da garantia do emprego e o processo pedagógico para o aluno.

“Se não tivéssemos reagido, não estaríamos aqui hoje. Infelizmente, eles estão vendendo a educação de Mateus Lemes. Estou no cargo há 16 anos porque estudei, passei no público e hoje gasto 10 minutos de casa até a escola. Se tiver que ir para outro local como será? Eu me preparei e prestei concurso público para o município de Mateus Lemes e não para outro lugar”, disse o professor Alexandre.

A Auxiliar de Serviços da Educação Básica, Ariane, afirmou que a maior preocupação é com o desligamento de todas as profissionais dessa área. “Muitas de nós perderemos nossos empregos. Penso também nos colegas de trabalho, alunos, professores efetivos. É um projeto preocupante. Se fosse muito bom, não estariam com tanta pressa em votá-lo. Peço aos nossos vereadores que nos representem, lembrem que esse projeto não está a nosso favor”.

A deputada Beatriz disse que esse alerta é extremamente importante, pois, a aprovação da municipalização vai provocar o desligamento de todas as auxiliares de serviço da rede estadual daquelas escolas municipalizadas. “Temos um aspecto importante que é a questão do IPSEMG, no que se refere à assistência à saúde. Hoje, o designado da rede estadual, ele contribui para a aposentadoria no regime geral, mas ele tem direito ao IPSEMG, na parte de assistência à saúde. Esse direito não permanece quando você não permanece vinculado ao estado. No caso das auxiliares de serviço, temos a grande maioria delas designadas. Teremos muitos prejudicados. Quem ganha com a municipalização? Quais são os aspectos positivos com ela?”

Vereadores contrários à municipalização

O presidente da Comissão de Educação da Câmara Municipal de Mateus Leme, Aldair José Guimarães, afirmou: “Falam em repasses de R$ 85 milhões do Estado, mas não vi nenhum documento que comprove isso. Se esse projeto é tão bom assim, por que ele precisa ser votado da noite para o dia?”. Ele denunciou que a matéria chegou para ser votada em três dias na Câmara Municipal de Mateus Leme e que a Comissão de Educação não recebeu nenhuma informação sobre os impactos da proposta.

Como presidente do Fundeb, o vereador também afirmou que não recebeu nenhuma informação a respeito e que na sua concepção tá tudo errado porque nada foi discutido com a sociedade.

Já o vereador Guilherme Henrique Oliveira da Silva fez um clamor à população de Mateus Leme para que defenda a educação e se posicione contra esse projeto e em defesa da educação. “Sofremos ataques de algumas pessoas que ocupam cargos comissionados em nossa cidade. Estão preocupados com esse valor de R$ 85 milhões que eu não acredito que venha. Falam sempre em possibilidade e não na obrigatoriedade. Precisamos discutir tudo isso, pois, lidamos com vidas e as pessoas têm sonhos. É preciso respeitar o funcionalismo público .”

A coordenadora-geral do Sind-UTE/MG, professora Denise Romano, falou da sua emoção em ver na ALMG, numa audiência pública, mães, alunos, professoras/as, ASBs, ATBs , todos juntos defendendo a escola. “E muito importante essa movimentação da comunidade escolar em defesa da educação como direito. Como todos aqui já disseram, o processo foi feito às escondidas, nem as direções das escolas que estão no alvo da municipalização foram informadas do que se pretendia por meio do Projeto de Lei do executivo.”

Denise somou o número de ASBs que correm o risco concreto de demissão com o projeto da municipalização em Mateus Leme e o número de alunos e profissionais impactados. Na E.E. Elias Salomão são 1.816 alunos e na E.E. Domingos Justino Ribeiro um total de 1.230 alunos.

Ela trouxe a experiência de municípios onde já aconteceu o processo de municipalização pelo Mãos Dadas. Citou Ribeirão das Neves, cujo processo se deu também na calada da noite, num final de semana, em que teria até um feriado. Tudo isso para invisibilizar a decisão e não chamar atenção de ninguém.

“Sem discussão pública, aprovaram a municipalização dos anos iniciais do ensino fundamental de Ribeirão das Neves e as escolas se tornaram municipais, da noite para o dia. Hoje temos 500 alunos que precisam de professores de apoio e o município não consegue contratar. Os estagiários que estão fazendo esse atendimento ganham cerca R$ 300 para trabalharem por 4h e atenderem a esses alunos, que necessitam de atendimento especializado, que o Estado é obrigado a fornecer.”

Denise disse que Mateus Leme tem 88 alunos que precisam ser atendidos por professores de apoio, de acordo com o senso escolar do ano passado. “ Então é importantíssimo que os vereadores de Mateus Leme rejeitem o projeto Mãos Dadas na votação que está marcada para essa sexta-feira, às 10h, na Câmara Municipal.”

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